terça-feira, 16 de outubro de 2012

Sedução


Dois olhos negros olham duas mãozinhas trêmulas. Nenhum dos dois recorda como começa um papo. Eu podia citar Spinoza, Engel e Hegel, posso até falar dos meus últimos trabalhos como pianista, será que eu chamo atenção dela? A mocinha não abre a boca, o que será que está passando na cabeça dela? Podia tentar adivinhar o pensamento? É! Assim, ela vai pensar que eu sou cara certo pra ela...
- a gente vai tomar cerveja? – disse ela
- sim, alguma preferência?
- pra mim tanto faz
Ela está tão bonita. O que será que ela quer comigo? Poxa!
- E então... e as suas canções?
- pois é, preciso mostrar pra você
Ela começa o papo e fica em silêncio. Esses olhos que olham trigueiros para a mesa, o chão e o céu. O que eles esperam do mundo? Queria tanto essa boca! O que será que ela está falando? Deve ser algum enigma, estou um pouco tonto com ela aqui. Essa menina pode falar palavrões terríveis na hora da cama, mas é apaziguado quando saem dessa voz doce. De novo. Ela ficou em silêncio. Vou ver se consigo adivinhá-la.
- Você tem, como chama mesmo?, acho que é complexo de alguma coisa, sabe?
- não sei. Do que você tá falando?
- Poxa, tem um livro, o Freud fala disso, é, como é o nome mesmo?
- complexo de Édipo
- Isso. Você tem Complexo de Édipo? Por isso, esse receio em assumir compromissos longos, os homens te assustam um pouco
Ela apenas balança a cabeça concordando.
- Tá bom! Tá bom! Vou parar de ler os seus pensamentos



Ler os meus pensamentos. Cada coisa! Será que esse cara não vai me levar pra algum lugar? A gente vai ficar aqui jogando conversa fora. Aí que vontade de não fazer nada!
- adivinhei o que você tava pensando
- uhum
Nunca vou entender. Caramba! Será que isso é coisa só de homens? Será que é só insegurança do primeiro encontro? Por que ele quer desvendar o mistério que existe dentro de mim? Não existe nada além. Só existe isso. Será que não é um misticismo que jogam nas mulheres, uma espécie de invenção dos mitos na sociedade. Eu não quero um homem que adivinhe os meus pensamentos, quero alguém que é tão banal quanto eu. No final das contas, o que existe é só uma pessoa, não quero que me transformem em musa. Elas (as musas) falam em enigmas, eu falo português, trazem o passado sedutor e atraem os viajantes com as suas vozes. Eu gosto mais de ouvir do que falar. Só quero mesmo que ele me leve pra cama e a gente namore bastante, afinal, é um modo de escapar do tédio que é morar nessa cidade. Que vontade de falar pra ele que a Esfinge é um mito, na frente dele só existe apenas uma mulher. Lá vai ele abrindo a boca.

Nenhum comentário:

Postar um comentário