terça-feira, 27 de setembro de 2011

Carta ao amigo (2)

Querido amigo,

ontem eu fiz vinte anos, você já envelheceu, provavelmente conhece mais da vida do que eu. Sinto muitas saudades e muita vontade de conhecer coisas novas, eu estou com um delicioso medo e uma profunda vontade de continuar errando. Viver é um perigo, todo dia é dia de morrer um pouquinho.

Você que me viu aprender a andar, acha que vou mudar? Vou virar mulher? Vou virar humana? O que eu faço pra continuar assim no caminho certo? Às vezes, me pego pensando que o melhor caminho são os desvios de muitas estradas e que a vida não chega a destinos intactos e perfeitos como os livros. Não tenho mais o mesmo pique que antes para os estudos, estou um tanto sei lá, meio emburrada e quão encabulada de tantas teorias inúteis. A vida é cheia de inutilidade, né...

Eu arranjei namorados, deixei namorados, transei com alguns caras e conheci alguns arrependimentos, mas não acho que fiquei mais adulta por causa disso. Olho-me no espelho e sinto ainda uma tal menina increscente. Vou morrer jovem inevitavelmente e meiga e bela. Você que é jovem a mais de vinte anos como é a vida depois? A gente sempe acaba com essa pergunta, tanto pras coisas banais, quanto pras coisas profundas. E depois?

E o amor? E o ódio? E os homens? Meu amigo, eu acho que eu nunca vou entender nada mesmo. Sou uma idiota por causa disso, né... Uma tonta que perde o tempo com desesperos improdutivos. Não sei se o mundo vai mudar (talvez sim, hoje as mulheres falam coisas que não falavam antes). Eu vou assistir o mundo amadurecendo? Será que você, meu amigo, vai ainda ser padrinho dos meus filhos? Será que eu terei filhos? Aí... Que assustador! Ainda desejo viver tantas bobagens desconhecidas, será que você conhece metade do que eu conheci até agora? Se você me contasse pelo menos metade da sua vida talvez me responderia as minhas perguntas e as coisas ficariam mais simples do que estão parecendo. Eu me sinto tão criança, acho que sou menina com seios e sangue todo mês (provavelmente é isso que eu sou).

Meu amigo, eu vou ficar bêbada, vou tomar bebidas que nem conheço o nome e fumar alguns maços de malboro pra ver se assim as coisas resolvem-se por si mesmas. Se tivesse aqui você falaria pra mim que a vida não se resolve com desesperos e embriagando-se, mas provavelmente não me impediria de errar. Você não me entendia, eu também não te conhecia, éramos jovens demais, não conhecíamos os segredos das nossas personalidades e pra onde elas poderiam descaminhar. Mas ainda vai chegar um dia - assim eu espero - que vamos rir desses desesperos e contar pros nossos outros amigos jovens sobre as vicissitudes descomplexas e esquisitas que a vida nos coloca. Vamos levando!

sexta-feira, 23 de setembro de 2011

segunda-feira, 19 de setembro de 2011

Janis e divagações à toa

"... é preciso ter muita sabedoria para saber reconhecer os encontros que a vida te dá, mas mais do que sabedoria é preciso ter uma certa loucura e ousadia para se entregar a um encontro que a vida te deu..." 

sexta-feira, 16 de setembro de 2011

Do verbo ser irregular

(...) O que me expressa além da boca e dos olhos é toda minha irregularidade do verbo ser.



Conversa entre duas moças





- olhe pra mim, o que você vê além de peitos, boca e olhos?
- eu vejo uma menina que está tentando se descobrir, você vai achar o seu caminho. Acalma a sua inquietude!
- se eu acalmar ela é provável que eu deixa de me expressar poeticamente? Amiga, eu quero trepar com alguém que me olha nos olhos, eu quero sorrir com alguém que chora quando perceber pequenas demonstrações de carinho e alegria, eu quero alguém que me liga em pleno domingo de manhã não pra ver se a minha casa está livre pra namoricar, mas pra falar besteira, escutar sobre música ou coisas idiotas masculinas. Meninos não gostam das mulheres inquietas ou será que o mundo ficou tão de cabeça pra baixo que as pessoas deixaram de gostar dos papos onde as palavras são mais do que expressões verbais do nada?
- menina, você tá tentando...                                                                     
- eu sou jovem hoje, bonita, com seios firmes, boca límpida e rosto inocente. Amanhã serei uma velha, estou tentando o quê?  Você sabe o que você tenta?
- não sei
- eu  também não... Acho que viver é um absurdo!  Será que um dia um homem ao invés de me mostrar como gozar com minha xotinha vai me dá orgasmos na alma? Será que não nasci andrógina, nasci apenas mulher? Nasci pra ficar sozinha com minha encantadora subjetividade e um olhar tão penetrante que atravessa qualquer libido dos carentes e canalhas – alguns minutos de silêncio, ela bebe outro copo e responde para ela mesma – nasci com a maldição dos escritores malditos, a solidão dos instáveis e a alma dos inquietos! Nenhum homem será capaz de me aguentar, sou por demais uma chata! Me resta os poemas e livros e música e teatro, me resta apenas o que consola até Deus, a própria criação. 

Since I've been loving you - Led Zeppelin

quinta-feira, 15 de setembro de 2011

carta ao amigo

Meu amigo,

ajude-me a curar de minhas angústias. Sou uma pessimista com grandes notas de rodapé que sinalizam pequenas melhoras do país cujo é minha pátria materna. Estou cansada, um tanto à flor da pele, estou com saudades das nossas besteiras de manhã e ficar cantando sertanejos para descansar a mente dos intelectualismos de segunda mão.

dê-me respostas objetivas sobre o futuro, sobre a morte e o amor. Conte-me se eu estou no caminho certo, uma pequena indicação de que o caminho meu é meio certo ou meio errado. Estou cansada de tantas dicotomias, um pouco saturada de lutas que se conseguem minúsculas conquistas, corre-se cem quilômetros para conseguir efetivamente um centímetro de realização material.

Meu amigo, você ainda escuta blues, ainda ama o seu homem, ainda gosta de poesias marginais? Eu não sei mais quem eu sou, não sei mais quais serão as minhas vontades daqui dois minutos. Não leio mais, não como mais (não porque eu me apaixonei; mas porque é demais meu amigo! É demais!), estou muito magra, não consigo dormir. As minhas vadiagens consomem demais os meus dias e as mãos masculinas encostam-me com carinhos não apaixonados, é só sacangem, é só putaria.

Essa angústia é incurável? Se eu trabalhar melhora? Se eu ganhar dinheiro acalma? Se eu tiver filhos diminui? Se eu casar não vou me sentir mais sozinha? Tantas perguntas, meu amigo, por que você não me responde somente uma? A vida é estranha, não tem professores que indicam notas altas ou baixas para saber se está indo bem ou mal. Meu amigo, como eu estou com saudades de você! Vamos sair um dia desses para reclamar da vida, para cantar aquela música e relembrar quem nós éramos um pouquinho, vamos falar de amores consumidos, tomar um guaraná, uma vodca ou coca-cola, vamos falar de rock n' roll ou de bossa nova, vamos papear em pleno domingo e esquecer que somos civilizados. Meu amigo, que saudade! Que saudade que tenho de você... 

segunda-feira, 12 de setembro de 2011

Diego, um muso de quinta

Ela fumava um vila rica, porque Diego o oferecia. Tragava, pensando que talvez um dos melhores venenos inventados, com uma bela estética, era cigarro. Só fumava com homens, depois do sexo, gostava da cena com olhos nus e cabelos lisos alheios ao pensamento de outro moço que logo ia desaparecer de seus lençóis. Ariana fotografava na memória aquelas paredes brancas, a cama bagunçada, o cheiro de cigarro e o olhar do moço idiota querendo comê-la de novo.  
- o que cê está pensando? – Diego lhe questionava
- em nada... – soltava a fumaça pelos lábios – e você?
- quando estou com você, eu não sei o que falar, falo o que me vem na cabeça – Diego agarrando-a sem cobertas, ela riu porque não sabia o que dizer.
Beijando a nuca, tirando os cabelos dos cantos, mordeu-lhe as orelhas. Ariana arrepiou-se, amolecida, a xotinha molhada, permitiu que o muso a tocasse, enquanto o pau entrasse no cú. De súbito, Ariana pensou nos peixes do aquário e naquela música que não recordava o nome – “acho que é do Gonçalves, talvez do Rau....humMmM...”
- doeu? – perguntou Diego
- um pouquinho – suspirava com voz mansa
Diego, então, masturbou-a mais, beijando mais as suas orelhas e retornou com pau no cú; cochichando aos ouvidos da pequena se estava bom assim ou desse jeito. Ariana gemia com certo prazer e uma sensação estranha de não tirar da memória seu muso de segunda-feira.
- aaaaaaaaaaaah... Paulo! – gritou o outro nome. Diego parou de repente e a questionou:
- Paulo? Quem é ele? 
Ariana enxergou-o de viés com alguns fios de cabelo escondendo partes de seus olhos. Ficou em silêncio, não soltava nada, Diego estava suado e seus olhos imploravam alguma explicação.
- acho melhor eu ir embora – a voz saiu primeiro do que o pensamento de Ariana.
- pêra aí! Volta aqui, a gente nem terminou, meu anjinho! – Ariana sem saber o que fazer vestiu suas roupas, olhou com ardor nos olhos e lascou-lhe um beijo fresco e breve.
- adeus, meu amorzinho! – a porta bateu leve na cara de Diego e ela foi embora.

um sonho de flor

as flores murcham às quatro meia
desfolham as viçosas manhãs
sem dizer adeus
deixam as camas desarrumadas
e fogem
sem beijos de despedidas

seus olhinhos safados
pedem mais carinhos línguas
disparadas pelo corpo
cadentes e sozinhos
elas pedem
um pouco mais
e desaparecem

as flores desabrocham depois das dez
acobertadas de espinhos
embelezando o seu cheiro gostoso
e elaborando suas pétalas
com cor de vida
beijam sozinhas
e acordam mais belas
fugitivas

as flores morrem aos vinte e sete
mitificam-se e nem sempre renascem
as seis da manhã
muitas vezes, permanecem
lindas
anônimas

as flores são mais atraentes
que as fotos
elas gritam
as calcinhas da bunda tiram
e gozam
as cinco, seis, quatro
(de manhã, de tarde ou de noite)

as flores são malvadas
(desnecessárias),
mas como gosto delas!
gosto tanto que um dia
serei uma

Obrigada, meu amor

Todo fenômeno da despedida se inicia com a segregação de duas pessoas que um dia se amaram demais. Aquele que um dia me disse roubar a lua, sai por essa porta e arranca meus restos de artérias que, até noite passada, ainda se misturaram com as dele. As mãos, sem dúvida, são as partes do corpo que me dá mais raiva, escorregaram por entre as pernas, peles e pêlos... Ódio? Talvez, o que eu sinto mais falta dele é do pau. Bem que podia castrá-lo.
Não tomo mais pírulas. Depois que ele foi embora não arranjo nem o porteiro da esquina pra trepar comigo, agarro-me a travesseiros, lembro de suas palavras sacanas, desordeiras. Fiquei, concerteza, igual a um bicho careta e fascinado por canções repletas de clichês; esses dias planejei o meu suicídio, mas desisti, resolvi matá-lo com pauladas de bombeirinhos e cervejas na mesa de um bar desconhecido, onde tocava Fagner. Sei que não resolve o problema. Porém, pelo menos, eu o mato de algum jeito e tiro o gosto de sua porra na minha boca, até encontrá-la outra.
Sentirei saudades de tanta coisa daquele homem. Dos seus olhinhos que me olhavam sempre querendo me engolir viva, os sonhos que ele me contava com tanta energia e da gente se amar por horas até eu acreditar que tinha nascido colada no tronco desse moço. Inclusive no chuveiro, nua, estava ali me imaginando com ele, com suas ridículas mentiras que me feriram com tanto amor e suas maravilhosas fantasias que me tornaram mais mulher, mais única e viva. Obrigada, meu amor...
Odiá-lo foi a melhor coisa que eu fiz na minha vida. E saber que aquele homem, ao lado daquela vadia, já foi meu, me dá um poder tão absurdo. O poder de uma mulher que um dia amou demais um só homem e foi abandonada numa noite de sábado quente com míseras mensagens virtuais as quais diziam que tal moço não me amava mais. Obrigada, meu amor, pela sinceridade de não ter querido ser meu amigo e ido embora sem palavras melosas.  


Verdades de puta

Milagres do santo pinto de pinteiro
sonhos ludibriantes de Antônio
Porra! A vida é um lixo
dos lustres que eu busco
é o meu luxo

Ao invés de me prometer os céus
Mete logo teu pau
no lugar que quer
e some

(não vai dizer-me que não era
isso o que querias?)

Não mentes
é pecado enganar uma mulher
porque ela logo te enganará de volta
As xotas são mais complexas que paus
Desses bosques mistérios entrementes
escondem-se por entre arbustos e naus
ondas me engolem de incoerências
Talvez seja o mar, o gozo
A vida.

Não gosto de dar pra negros
Resguardo meu corpo
Com brancos
Uma maneira diferente de relembrar
minha virgindade
se não é amando como os cultos
pelo menos é trepando com os puros
De pele, grana e dignidade
Dos botecos e uísques
caros

Não me dê jóias
Prefiros os elogios
Nasci felina no dia oito de agosto
Meu maior desgosto
É a desgraça que comeu meu ventre
com a doença de morte
Não vou virar puta véia
Morrerei antes

Só que me permita, menino,
Dar-te um conselho:
"... A vida é mais bela que parece
Perceba isso dantes
Que a alma apodreça seus dentes
sangrando nos quartos sujos
pros ratos beberem o resto de suor
envenenado pelas alegrias d' outros"

Espírito Roubado

não leva embora todo meu espírito
carrega minhas carnes por kilo
meu coração funciona no grito
grito de prisioneiro:
"Salve teu peito!"

salva a alma que lhe resta
mata tua bontade
destila todo teu ácido
nesses porcos de espíritos disfarçados
de velhas frágeis nos cultos espíritas


amargando o café,
mais amargo é o meu dia
engulo facas filosóficas
tomo enlatados econômicos


ainda morrerei de aglomerados
humanísticos
sugam os sucos dos meus fulcros
mastigam as células místicas
eu como capim teológicos
de falsas ideias paradísiacas


vou embora pro Caribe
Ou, talvez, pra Suíça
procurar os meus lucros
talvez eu realizo
sonhos bruscos
compro
um barco
um amor
masturbo
o meu suor
alivio
meu jack estripador
dosmesticado civilizado
ou então.... eu morro

domingo, 11 de setembro de 2011

O tempo não pára

A Leila Diniz, as coisas de atriz

Existem certos lugares comuns quando falam sobre a figura monumental de uma atriz. Leila Diniz que lia Pasquim; Leila Diniz que trepava pra caralho; Leila Diniz que gostava dos canalhas; Leila Diniz que não escondia o que sentia; Leila Diniz que não encena personas na vida, só cenicamente; Leila Diniz que morreu na idade épica, sendo jovem para sempre.
Qual é o mistério do mundo dionisíaco? A atriz enxerga toda a plateia nos olhos, não se consome de medo, não demonstra seu receio de enfrentar a fantasia de dramas que não existem na vida real, no entanto a mágica acaba. A vida retorna, ela é atriz, Leila Diniz que trepa pra caralho, mas comprando jornal, chocolate e frutas pela manhã. Caminhando para o tédio de uma reunião familiar em pleno domingo de sol, encenando uma menina meio comportada para não ter que explicar tudo, a família grande diz que ela não sabe o quer. Leila Diniz responde: “eu só quero é me divertir....”
A atriz, com raiva, nem perde seu tempo com papo cabeça, porque insistem em querer vê-la chorar só para demonstrar toda sua competência cênica no mundo real. A vontade que dá é em mandar todo mundo tomar no cú, mas calmamente responde: “ atriz faz os outros chorarem, se pra ser atriz bastasse simplesmente demonstrar as lágrimas como palhaço de circo, então teríamos centenas de Bibi Anderson e Cacilda Becker”. Eles riem, Leila Diniz olha com pena e desprezo e desiste do papo cabeça familiar, escolhe definitivamente a figura de uma burra e vadia que não sabe o quer. Pelo menos, atriz se diverte mais fazendo isso do que provocando pensamentos inteligentes.
Nota que as pessoas estão mais velhas, ela está mais jovem. As musas demoram séculos para nascerem, os olhos penetram a libido de alguns homens, ela desaparece como os canalhas e esquece como os vadios. Distraída, a atriz gosta de depreciar o seu trabalho para lembrar que não aprendeu nada útil sobre o combate da vida. Além das coisas importantes do gênero humano, o ser humano muda, o ser humano mente, o ser humano caga, come e transa, o ser humano é estranho e nem sempre ele é protegido por deus. Leila Diniz pensa que o mundo seria melhor se tratassem deus utilizando o pronome você e não vós. Ela conclui que, amadurecendo, se tornará melhor arteira, pois os despudores vão se apropriando de seu corpo. Aos poucos, a vida complica-se mais e mais e fica mais divertida.

seu amor é igual ressaca


Seu amor é igual ressaca
A água que cura
Dói
Na cabeça, no corpo
No rosto, nos olhos de casaca
Roxos

Dói
Amor, lembrar de sua barba
Que roçava minha pele de donzela,
Desleixada,
Meus seios pungentes
Saltando pra fora
Gemendo  inteiros
Por você

Dói
Naufragando nas suas mãos
Sonho alucinada
Por mais um dia noturna
Tremendo circunvoluções
De beijos perdidos
Corações iludidos

Amar
É coisa de gente tola
Que gosta de sonhar com
Piruetas de fogo n’alma
Sua barba agora é minha
Nessa despedida nem me deixou
O que eu tinha
Minha sacanagem
Dói

Amanhã é outro dia
Arranjo outra barba
                  Outra folia 

                                                     Não dói mais  

Pensamentos


Se eu corro
O quarto explode
O caos consome
Meu furor

Voa o pensamento
Arrepios de momento
Sonhos de madrugada
Água ardente
Quente

Meu pijama
Minha cara de demente
Não engana ninguém
O evidente:
Ando pensando muito em você
Ultimamente

A invenção da musa

órfã de mãe
órfã de gatas
órfã de amigas
órfã de cadelas
eu tive que resignar-me
a mim e inventar uma
nova musa

Uma musa que colhe
dos belos musos
palavras e beijos
profundos

profanos segredos
e imundos
descobrimentos
desse corpo 

sábado, 10 de setembro de 2011

Bossa Nova e Rock n’ roll: Observações sobre evoluções desprecisas de uma história

 ao meu amigo Monteiro que me ensinou
algo de rock 
algo de futebol 
um pouco de lamentação 
algo de alma

Nada é tão precioso a ponto de ser eterno. As boas músicas efemerizam a nossa realidade e eternizam as nossas memórias; quando menina ouvia Toquinho, Elis e Vinicius mais do que bebia água. Aprendi a tocar violão, porque gostava de blues e imitar os acordes difíceis da bossa nova. Ouvia rock, mas não me cabia qual era o motivo, a chama subversiva não me contagiava. (Desde cedo, eu saquei que artista não tem que agradar, os melhores iam em direção contrária do sentido imposto por algum patriarca).
Mas houve uma mudança tão profunda em mim, conheci um moço gordo de olhos azuis e melancólicos, um vagabundo, um indivíduo típico de histórias norte-americanas, que bebe mais conhaque do que água. Ele ouve emaranhados de Engenheiros do Hawai como se as canções fossem dele, contagiou-me com uma certa efusão de tristeza que já tinha me esquecido, transformando os meus ideais em litros de cenas alegremente depressivas, todos os gritos reprimidos foram soltos na pinga e no rock.
- bruninha, o rock salvou minha alma, mas estragou o meu corpo! – e com uma risada rouca reiterava – e o que cê acha do bota fogo?
Por trás de tantos risos, a fumaça esvaziava um olhar doce, evidenciando um caminho tão longo que lhe dava licença de utilizar tantas palavras dionisíacas. Não era um amigo que se cria um vínculo eterno, logo desvincularia por completo. Seria rapidamente órfã dele assim como fui com a Amanda, a Tais e a Clarice. No final, teria que saltar os muros impostos com minhas próprias pernas e acobertada com seu rock n’ roll, o sangue contínuo de suas palavras.
- eu era tão bossa nova que tinha me esquecido do rock, - confessava ao meu amigo
- eu tenho uma teoria da bossa nova, às vezes é bom ficar no violão e no banquinho, mas depois eu volto pro rock and roll pra botar os pés no chão –  tragando inexpressivo outro cigarro malboro.
Acho que durante muito tempo, perdi-me em mim. Influenciada demais por minha bela subjetividade, muito mulherzinha, viciada demais com tantos intelectualismos, sem gritos, sem inquietudes pra fora, sem sexo, sem porres, estava demais sóbria. Com tanto equilíbrio, tinha me esquecido das minhas metamorfoses, precisava inventar o amor, precisava inventar um drama. O mundo estava inexplicável de novo, os sentimentos voltavam com rangidos finos de guitarra, a rebeldia contagiava-me, agora podia assumir um pouco de poesia. O rock tinha me salvado! Me colocou de novo no chão tão bossa nova, uma alma contaminada por muito intelectualismo.
- bruninha, eu não quero que te falar o que eu sei, não quero que você se torne eu, porque eu vou embora, então não sou seu exemplo. Sou um herói errado, nem tenho o corpo de dezoito mais, sou gordo e perto da morte.

sobre ideias

Esses dias eu tive uma ideia enquanto estava no ônibus azul, lutando contra a morte e contra o tempo, aproveitando os meus minutos de juventude fortalecida, esperando mais outra profecia irrealizada do fim do mundo, revendo outra frustação de perceber a história passar por nossos olhos, tomando coragem pras dramas inevitáveis, sonhando sonhos que não são meus, vadiando sem dinheiro e emprego, tive a ideia. Mas ela desapareceu como os meninos.

A juventude falida

Numa certa tarde eu desapareci
me desprendi
de tudo que era eu
roubando seus
Virgílios e existências
pra me auto-afirmar
como artista

não devolvi A Divina Comédia
em pleno dia de sol
meu ponto de vista
era uma chama morta de ideologia

Amigas,
já não somos a geração coca-cola
fugimos da escola com a lembrança de jornais
e cotidianos banais
nesse secúlo vinte e um
sou mais uma que espera
junto com a minha geração falida
o mundo acabar

sexta-feira, 9 de setembro de 2011

Confissões

Eu na realidade não sei que dia é hoje. Acordei muito rock and roll, dormi meio bossa nova
essa tarde vou de bamba, no miudinho procurar meu nego
toda sacanagem é melhor que blues

eu minto demais. Até pra mim...