sexta-feira, 15 de outubro de 2010

O Problema do Eu-Lírico

Na realidade, estudar literatura e linguagem nunca ajudou-me nos problemas e anseios do mundo cotidiano. Sou mesmo uma fugitiva. Deveria, pragmaticamente, separar e inventar um eu-lírico que não cruzasse com a minha vida biográfica: esse é o contrato ficcional, - eu finjo que existo e o leitor acredita. Crio uma estética sobre a pessoa que representa a mim mesma (ou pelo menos, acredito que represente a mim) , para o leitor entrar no universo literário com o ponto de vista dessa imagem que é de mentirinha. Essa imagem pode ter várias roupagens literárias (estilos para os mais cultos) e é dessa maneira que o universo literário ganha-lhe predicados, cor e cheiro. Mas existe um sério problema comigo, não consigo mentir senão for falando a verdade; minto porque sou sincera.

Será que eu preciso mesmo escrever explicitamente que sempre tive problemas com a escolha da sexualidade? Que, na realidade, nunca me imaginei cuidando de casa, comida e filhos. Enxergava-me como uma pessoa necessariamente artística, talvez uma artista ( talvez?) e que o grande problema de me assumir como uma poetisa não era eu; mas o mundo que é dominado pelo império da crueldade. Há uma determinação até na escolha do meu eu-lírico é preciso que seja a mais contraditória em relação a gentinha dominante, pergunto-me, qual é a razão de contradizer tanto? Resposta: várias, de Sartre, de Nietzsche (nunca me interessei na leitura deles) e de tantos filósofos que tentaram dissertar sobre a razão da literatura. Outra pergunta: quem conhece esses filósofos? Quem são leitores de literatura? O que é essa maldita literatura? Garanto que os grandes leitores de literatura não tomam ônibus quatro horas da manhã e enfrentam a Dutra para trabalhar na capital de São Paulo. Tenho absoluta certeza disso. Essas teorias filosóficas que o texto literário se apropriou, não servem como literatura impactante. Afinal, pergunto-me, a gente ler textos de literatura para brincar de ficção ou para criar filosofias necessariamente sérias? Entender a literatura como algo sem brincadeiras é um grande equívoco. Na ficção, há uma necessidade de sentir uma alegria difícil.

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